9 de maio de 2010

el desierto


Continuamos a conduzir, a comer e a falar,
avançamos no escuro, folhagem dentro.
Desabou mais um homem, um cartão que ruiu,
paramos um instante
olhamos de lado seguimos adiante.
Com a mão no volante
cantilena mental
avançamos entre o verde e a espessura da noite.

Um rapaz tresmalhado regressa a Beirute,
vindo dos massacres, sacode o olhar
a cidade continua
a poeira é a mesma
dança e bebe no interior da guerra.

Estamos todos em guerra mesmo sem guerra.
À medida que uns tombam, vacilamos e seguimos.
Ajeitamos a mortalha contra a brisa nocturna
e persistimos na frente.
O caminho não espera, o tempo decresce.

Em Beirute ou Little Indian todos vão cair
Antes de nascermos já estamos em guerra

Por vezes uma pausa
e logo prosseguimos.
Mais um comprimido contra o medo.
É certo que vamos cair.
Trituramos legumes,
na sopa boiam dedos.

Instalados para a morte lemos a guerra nos jornais

Avançamos na folhagem, avançamos no medo.
Caminhamos seguros, pisamos fragmentos.
Escrevemos e amamos, triturados por dentro.
As ogivas na praia, as ruas estilhaçadas.
A cabeça no deserto, as mãos a descoberto.

Toda repetición es una ofensa
Y toda supresión es un olvido


Quantas vezes morremos até descansar?

8 comentários:

at disse...

verdadeiro e surpreendente

blue disse...

que bom, Rosa.

io disse...

muito, muito bom.

Isabel Sofia disse...

magnífico! É poesia.

mariantonia disse...

muito bom.

henedina disse...

Mas que preguiça é esta Rosa? Estamos em Junho. Para qdo um post?

rosa disse...

henedina: por sinal, junho e julho são os piores meses do ano na minha profissão vomitória e idiotizante.

além de que isto não é forja de ferreiro...

curiosos que quanto menos posto, mais comentários há.

também posso perguntar aos leitores preguiçosos: para quando uns comentários mais desenvoltos? ou mesmo tímidos.
para além dos fiéis e regulares que se mantém alerta, poucos despreguiçam...

Filipa Júlio disse...

pronto, acabei de enfiar a carapuça...