10 de janeiro de 2010

Reviralho argumentativo


Agan Harahap

Depois da pequena pausa para ganhar balanço, com suspiro clandestino:
— Ele não quer é fazer nenhum, sabes?... Estou farto de lhe sugerir empregos, porque o vejo perdido. Há tempos disse-lhe: “Por que é que não vais para instrutor de condução? Tu até conduzes bem...” E logo ele: “Ai não! Isso não, que exige muita concentração e depois tem a parte da mecânica e tudo... Não, não.” De facto, a mecânica é chata. Até lhe disse: “Olha eu tinha um amigo, professor universitário, com doutoramento e tudo que, quando lhe mandaram abrir o capô do carro, puxou pelos primeiros fios que viu e arrancou os fusíveis do carro. Mas tu, pelo menos, sabes abrir o capô do carro, não?” "Bem, isso sei", dizia ele. Mas a mecânica, a mecânica...
Ah, depois esteve como assistente numa loja mística na Figueira e eu vi logo, pela experiência anterior do curso de massagens nos pés, que aquilo não ia dar bom resultado. Bom, não queiras saber: no primeiro dia desistiu, porque disse que não suportava a carga negativa! Chegou a casa a gemer: “Não aguento, não aguento, nem imaginas os problemas que entram por aquela porta dentro! São umas pessoas estranhíssimas que ali aparecem! Não posso, aquilo faz-me muito mal!” Pudera, o que é que ele estava à espera, numa loja mística com uma bruxa que se anuncia como curadora de cancros e vingadora à distância?! Ainda por cima na Figueira! Que depressão!... De maneira que a coisa acabou logo ao primeiro dia. Até que esta semana me lembrei: ele é alto , atlético, tem bom porte, pode tirar partido disso. Então disse-lhe: “Por que é que não vais para Securitas? É preciso pensar pouco para ser Securitas.”
— Ai que horror! Tu disseste-lhe isso? — espanto-me eu, acordando da modorra da ladainha.
— Não! Apresentei a coisa ao contrário. Disse-lhe: por que é que não vais para Secutitas? Aí tens muito tempo para pensar...

De facto o meu amigo A. tem razão: o tempo para pensar ou não pensar é absolutamente voluntário e indiferente enquanto estamos de plantão. Nunca imaginei que a actividade (ou a inactividade) de um Securitas nos levasse tão longe na sinonímia! E na especulação.

Fiquei foi sem saber se o outro, o madraço espadaúdo, seguiu o alvitre.

4 comentários:

henedina disse...

E dizem que são os homens que as querem bonitas e não muito inteligentes.
As mulheres estão, tb nas relações, a passar por uma fase que era considerada "masculina"?

Sim, sim ainda continuo feminista.

io disse...

Suspeito que o rambo lhe disse que: e por que carga de água haveria eu de querer tempo para pensar? :-)

rosa disse...

não, ele é meditabundo. é, é calaceiro.
é do baixo mondego e chega.
também é de família: o pai reformou-se aos 50 e picos.
que inveja, que inveja!...

Isabel Sofia disse...

Quem em dera reformar-me. Estou tão farta....
sim, sim, tens razão. As usual...