30 de maio de 2009
Maio, maduro Maio
Chegaram finalmente primavera + verão: como um brunch.
A ver se duram uma semana.
O meu filho foi para Serralves. Eu vou para a praia.
É a leviandade das velhas gerações.
And Now for Something Completely Different
Sou fãs (plural/superlativo de fã).
Dos dois: star wars e ricardo queso.
29 de maio de 2009
when i grow up
era esta a coisa que estava a falhar.
para o bonirre.
(ainda assim, precisa de um toque. os funcionários não estão todos. só os adjuntos que estão mais para as maquettes e outras coisas francesas.)
anexo: ouvir também Memories from When I Grew Up (remembered by Subliminal Kid)
este não chegou ao youtube.
confesso que não vi no youpope.
para o bonirre.
(ainda assim, precisa de um toque. os funcionários não estão todos. só os adjuntos que estão mais para as maquettes e outras coisas francesas.)
anexo: ouvir também Memories from When I Grew Up (remembered by Subliminal Kid)
este não chegou ao youtube.
confesso que não vi no youpope.
27 de maio de 2009
...e, por favor, não nos deixeis cair em mira técnica
Senhores ouvinte: o link que eu pus anteriormente, e agora retirado, não fui eu, foi o meu naboheterónimo.
Já vou telefonar para os serviços municipalizados.
26 de maio de 2009
União Ibérica
freddy, postdamerplatz
(grafia castenhana)
Eras, instante, tan claro.
Perdidamente te alejas,
Ocorrem-me em revista, exposições, países:
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!
Cernuda/Cesário
25 de maio de 2009
Tecnonaba II
O jantar foi bom e a bailação, a seguir, ainda melhor: memorável sessão de música pela minha amiga Guida Fonseca e su partner Ana Paula aka Pussy Cat & Kill Kill.
Sim senhor raparigas, temos dj’s!
Mas voltando ao tema nabo e já com o atraso das máquinas de roupa e etc de domingo.
O imblóglio estava no facto de eu (e mais alguns nabos como eu) não clicarmos onde devíamos para ver o texto todo, acrescendo a isto a embrulhada de várias conversas sobrepostas. Tanta rapidez, simultaneidade e profusão resulta em que o que se escreveu há dois minutos já tenha desarvorado para outra página e nunca saibas bem quem te ouve e que quantidade de texto teu está a ser lido. Canseira!...
Ou seja, é tudo muito rápido, muito ligeiro, muito parvo. Para mim não dá. Sou muito antiga: praticamente ainda estou a descobrir as possibilidades do copy e paste e já o mundo me exige blogs, facebooks e twiters! Tenham dó! É como aprender a estrelar um ovo e pedirem logo a seguir para fazer Cailles en Sarcophage à maneira do chef do Café Anglais, iguaria suprema entre as várias na Festa de Babette (cf. conto de Karen Blixten e filme de Gabriel Axel – sim, que eu com a cultura não brinco; e não, não existe em versão mp3)!
Mas não pensem que exagero. Há poucos dias um amigo (inteligente, culto, sobejamente publicado) dizia-me que um dia destes também se ia fazer sócio do facebook. Para este ainda cheguei e lá lhe disse que sim, até porque a quota e jóia de inscrição não são caras...
Não sei se estão a ver: há pior do que eu. Há sempre. É o que vale.
Outro exemplo eloquente da minha nabice entranhada é a quantidade de vezes que pergunto as mesmas coisas elementares aos amigos. Um dia destes, um dos que me atura perguntava-me pacientemente pelo telefone, numa tentativa de ajuda humanitária extrema, qual o tamanho da imagem que eu estava a querer usar. Ao que respondi com a maior espontaneidade: “Não sei! Espera aí que eu vou buscar uma régua!”
Vi logo, pela pausa diplomática que se fez sentir do outro lado, que a minha resposta não ia ser a dica da semana.
Mas o que verdadeiramente me fez começar este relato foi a notícia de que o Papa tem um portal na Internet com ligações para o facebook e para o iPhone! É o www.pope2you.net. Quando li o endereço modernaço pensei por segundos que estava no caderno do “Inimigo Público”. Mas não. O Rato Zinguer diz mesmo “Levem o testemunho da vossa fé ao mundo digital”. Nem comento esta do “digital”. Adiante, deve ser da tradução.
Claro que já fui espreitar o site papista e claro que aquilo funciona mesmo.
Salta-nos um vídeo do youtube (não devia ser youpope?) com um senhor calvo e respeitável que dá pelo nome artístico de Arcebispo Celli e que apresenta o Papa como uma mescla de um protagonista de uma daquelas séries de grande qualidade “a que só a BBC nos habituou” com um psicólogo para alunos com Nê.éés (para os leigos: necessidades educativas especiais).
E assim, o Arcebispo apresenta o colega e patrão como “a friendly Pope, a gentleman Pope (!), an affable Pope, a welcoming Pope”. Nem mais! Isto é que é marketage!
Não, a sério, acho bem. Perante uma “alegada” (só alegada) crise de vocações, há que atacar com o cristianismo tecnológico.
Eu tenho é inveja. Eu queria era ter apoio técnico já não digo de um Vaticano, mas pelo menos de um recém recruta da Worten.
Para além do básico, no site do Papa há ainda a promessa de gadgets e um link para um misterioso wikicath: parece nome de comida para a catwoman. Não sei é se a Michelle Pfeiffer estará ao corrente.
Mas, meus amigos, no Vaticano também não é difícil fazer sites jeitosos. Vendo bem, não falta dinheiro: têm o PIB per capita mais alto do mundo (nunca se fala disso, mas é só de 416 mil US$, muito à frente do Luxemburgo que vem sempre em primeiro lugar nestas compitas e afinal tem um PIB miserável de 99,104 US$). Há dinheiro, portanto. Os informáticos não têm muito por onde se raspar - só há uma estação de correios e não há muita rua com recantos esconsos ou basfonds por onde se esconderem: afinal de contas são só 0,44Km2 com uma praça muito, muito ampla.
Está tudo muito urbanizado. É o paraíso (literalmente) dos arquitectos: está totalmente urbanizado. Não há mesmo agricultura. Nem uma hortazinha: tudo o que comem é importado – por isso é que precisam de ter muito taco, coitados. Árvores só mesmo no jardim do Pope: não há um arbustuzito, uma reles moita atrás dos quais quem perceba de computadores se possa esconder dos maçadores como eu sempre com dúvidas e enguiçanços técnicos. Fugir dali sem dar nas vistas é quase impossível: têm a fronteira mais pequena do mundo: só 4Km (praí 1/3 da avenida da Boavista – os portuenses gostam muito desta medida de comprimento).
Por outro lado, é o 4º país entre os 7 que têm mais de 1000 pessoas por Km2. Tem mesmo uma densidade populacional mais alta do que a do Bangladesh. No meio de tanta gente, é natural que haja muito informático à mão de semear. Couves é que não. Nem das de Bruxelas que são pequeninas.
Concluindo: assim é fácil! Assim há condições. Não admira pois que o Papa tenha um bom e santo portal. Eu é que já lá não vou.
Acreditem que tenho fotos e filmes acumulados de há seis anos a esta parte em aparelhos que já deixaram de funcionar e dos quais não sei sacar a informação nem para computador, nem para papel - este sim, seria o éden, para usar um vocábulo adequado à ocasião.
Enfim, já deu para perceber que a minha vida tecnológica é um caos. Por essas e por outras é que parei com o blog por quase um ano.
Felizmente para pessoas antigas como eu, as sapatilhas Sanjo estão de volta.
E não me digam que Sanjo e facebook não ligam. Se não percebem é porque já estão contaminados pelo facebook e pelo twiter e já só lêem metade dos parágrafos.
Deixo-vos com amizade - como dizia o engenheiro Sousa Veloso - e com os resultados dos quizes que fiz ontem, numa última tentativa de tirar algum proveito do facebook.
Imaginem que fiquei a saber que a minha época são os anos 40, tidos como revolucionários e glamorosos, como bolo sou um palmier (personalidade difícil, desejos requintados, aparência leve e sedutora, etc) e conheço tão bem os homens (tive 100% neste quiz – nunca tive 100% em nada!) que muito provavelmente sou um homem a tentar fazer batota no mundo quiz. Deixo-vos o resultado deste:
"How Well do you know Men?" with the result Excellent!! (100%).
Fantastic!! You really do know men pretty Well!! Either you're a master at what men really want or you've blatantly cheated! Or you might just be a man trying to find out if this quiz is authentic enough! whatever it is, Congratulations, you're an Expert on that pathetic species called "Man".
Nem sei se tenha orgulho ou vergonha.
Vou perguntar ao pessoal no facebook.
Sim senhor raparigas, temos dj’s!
Mas voltando ao tema nabo e já com o atraso das máquinas de roupa e etc de domingo.
O imblóglio estava no facto de eu (e mais alguns nabos como eu) não clicarmos onde devíamos para ver o texto todo, acrescendo a isto a embrulhada de várias conversas sobrepostas. Tanta rapidez, simultaneidade e profusão resulta em que o que se escreveu há dois minutos já tenha desarvorado para outra página e nunca saibas bem quem te ouve e que quantidade de texto teu está a ser lido. Canseira!...
Ou seja, é tudo muito rápido, muito ligeiro, muito parvo. Para mim não dá. Sou muito antiga: praticamente ainda estou a descobrir as possibilidades do copy e paste e já o mundo me exige blogs, facebooks e twiters! Tenham dó! É como aprender a estrelar um ovo e pedirem logo a seguir para fazer Cailles en Sarcophage à maneira do chef do Café Anglais, iguaria suprema entre as várias na Festa de Babette (cf. conto de Karen Blixten e filme de Gabriel Axel – sim, que eu com a cultura não brinco; e não, não existe em versão mp3)!
Mas não pensem que exagero. Há poucos dias um amigo (inteligente, culto, sobejamente publicado) dizia-me que um dia destes também se ia fazer sócio do facebook. Para este ainda cheguei e lá lhe disse que sim, até porque a quota e jóia de inscrição não são caras...
Não sei se estão a ver: há pior do que eu. Há sempre. É o que vale.
Outro exemplo eloquente da minha nabice entranhada é a quantidade de vezes que pergunto as mesmas coisas elementares aos amigos. Um dia destes, um dos que me atura perguntava-me pacientemente pelo telefone, numa tentativa de ajuda humanitária extrema, qual o tamanho da imagem que eu estava a querer usar. Ao que respondi com a maior espontaneidade: “Não sei! Espera aí que eu vou buscar uma régua!”
Vi logo, pela pausa diplomática que se fez sentir do outro lado, que a minha resposta não ia ser a dica da semana.
Mas o que verdadeiramente me fez começar este relato foi a notícia de que o Papa tem um portal na Internet com ligações para o facebook e para o iPhone! É o www.pope2you.net. Quando li o endereço modernaço pensei por segundos que estava no caderno do “Inimigo Público”. Mas não. O Rato Zinguer diz mesmo “Levem o testemunho da vossa fé ao mundo digital”. Nem comento esta do “digital”. Adiante, deve ser da tradução.
Claro que já fui espreitar o site papista e claro que aquilo funciona mesmo.
Salta-nos um vídeo do youtube (não devia ser youpope?) com um senhor calvo e respeitável que dá pelo nome artístico de Arcebispo Celli e que apresenta o Papa como uma mescla de um protagonista de uma daquelas séries de grande qualidade “a que só a BBC nos habituou” com um psicólogo para alunos com Nê.éés (para os leigos: necessidades educativas especiais).
E assim, o Arcebispo apresenta o colega e patrão como “a friendly Pope, a gentleman Pope (!), an affable Pope, a welcoming Pope”. Nem mais! Isto é que é marketage!
Não, a sério, acho bem. Perante uma “alegada” (só alegada) crise de vocações, há que atacar com o cristianismo tecnológico.
Eu tenho é inveja. Eu queria era ter apoio técnico já não digo de um Vaticano, mas pelo menos de um recém recruta da Worten.
Para além do básico, no site do Papa há ainda a promessa de gadgets e um link para um misterioso wikicath: parece nome de comida para a catwoman. Não sei é se a Michelle Pfeiffer estará ao corrente.
Mas, meus amigos, no Vaticano também não é difícil fazer sites jeitosos. Vendo bem, não falta dinheiro: têm o PIB per capita mais alto do mundo (nunca se fala disso, mas é só de 416 mil US$, muito à frente do Luxemburgo que vem sempre em primeiro lugar nestas compitas e afinal tem um PIB miserável de 99,104 US$). Há dinheiro, portanto. Os informáticos não têm muito por onde se raspar - só há uma estação de correios e não há muita rua com recantos esconsos ou basfonds por onde se esconderem: afinal de contas são só 0,44Km2 com uma praça muito, muito ampla.
Está tudo muito urbanizado. É o paraíso (literalmente) dos arquitectos: está totalmente urbanizado. Não há mesmo agricultura. Nem uma hortazinha: tudo o que comem é importado – por isso é que precisam de ter muito taco, coitados. Árvores só mesmo no jardim do Pope: não há um arbustuzito, uma reles moita atrás dos quais quem perceba de computadores se possa esconder dos maçadores como eu sempre com dúvidas e enguiçanços técnicos. Fugir dali sem dar nas vistas é quase impossível: têm a fronteira mais pequena do mundo: só 4Km (praí 1/3 da avenida da Boavista – os portuenses gostam muito desta medida de comprimento).
Por outro lado, é o 4º país entre os 7 que têm mais de 1000 pessoas por Km2. Tem mesmo uma densidade populacional mais alta do que a do Bangladesh. No meio de tanta gente, é natural que haja muito informático à mão de semear. Couves é que não. Nem das de Bruxelas que são pequeninas.
Concluindo: assim é fácil! Assim há condições. Não admira pois que o Papa tenha um bom e santo portal. Eu é que já lá não vou.
Acreditem que tenho fotos e filmes acumulados de há seis anos a esta parte em aparelhos que já deixaram de funcionar e dos quais não sei sacar a informação nem para computador, nem para papel - este sim, seria o éden, para usar um vocábulo adequado à ocasião.
Enfim, já deu para perceber que a minha vida tecnológica é um caos. Por essas e por outras é que parei com o blog por quase um ano.
Felizmente para pessoas antigas como eu, as sapatilhas Sanjo estão de volta.
E não me digam que Sanjo e facebook não ligam. Se não percebem é porque já estão contaminados pelo facebook e pelo twiter e já só lêem metade dos parágrafos.
Deixo-vos com amizade - como dizia o engenheiro Sousa Veloso - e com os resultados dos quizes que fiz ontem, numa última tentativa de tirar algum proveito do facebook.
Imaginem que fiquei a saber que a minha época são os anos 40, tidos como revolucionários e glamorosos, como bolo sou um palmier (personalidade difícil, desejos requintados, aparência leve e sedutora, etc) e conheço tão bem os homens (tive 100% neste quiz – nunca tive 100% em nada!) que muito provavelmente sou um homem a tentar fazer batota no mundo quiz. Deixo-vos o resultado deste:
"How Well do you know Men?" with the result Excellent!! (100%).
Fantastic!! You really do know men pretty Well!! Either you're a master at what men really want or you've blatantly cheated! Or you might just be a man trying to find out if this quiz is authentic enough! whatever it is, Congratulations, you're an Expert on that pathetic species called "Man".
Nem sei se tenha orgulho ou vergonha.
Vou perguntar ao pessoal no facebook.
23 de maio de 2009
Tecnonaba I
Sou uma tecnonaba.
Assumo, como agora se diz. E como assumo, estou perdoada, como agora se faz.
Assumo, logo esqueço.
Mas eu não esqueço. Nem que quisesse não poderia esquecer, porque a tecnonabice me complica imenso a vida. Todos os dias.
O conceito de tecnonabo está explicado num dos últimos livros de Miguel Esteves Cardoso, creio que no “A Minha Andorinha”. Quando li o artigo, todo muito bem explicadinho como é habitual no MEC, a pensar nos moços e moças dos 7 aos 77, adoptei logo o epíteto, o cognome, a aptidão. Passou a ser uma das minhas competências, como agora se diz e se exige. Neste caso a competência da minha incompetência. Enfim, fiquei mais contente por já ter um nome para a síndrome de que padeço (sim, síndrome ou sindroma são femininos – posso ser tecnonaba, mas tento não dar erros de português, o que não é fácil, diga-se).
E vem isto ao dance floor por causa do que me aconteceu esta semana.
Num destes serões da província estive eu a responder a várias pessoas no facebook. Para já, desconfio que isto não é assim. Não se responde no facebook como quem “deve” uma carta ou até um mail. Está-se ali e logo se vê quem está on line e pia primeiro.
Bom, mas eu estive talvez umas três ou quatro horas na conversa, ou melhor, no teclanço e, no final, só tinha comentários a dizer que não se percebia nada do que eu estava dizer, ou que só viam duas ou três frases, quando eu tinha escrito umas esforçadas duas ou três páginas de texto! Fiquei siderada com a injustiça! Como se não bastasse, já durante o “processo” da conversa, quando eu me entusiasmava mais, acabava o espaço disponível para escrever! Vamos nós lançados e eis que de repente ficamos desguarnecidos de material, como se tivéssemos que sobreviver com uma ração de combate na Jamba ou regatear senhas de racionamento na Segunda Guerra Mundial! Assim não, catano!...
Eu devia ter desconfiado quando comecei a ver alunos meus muitos entusiasmados com o facebook e, sobretudo com o twiter – houve uma despachada, uma “lista” como dizem os espanhóis, que até me disse que basicamente vivia no e para o twiter e que os trabalhos de “investigação” dela são todos feitos sobre e no twiter. Podem imaginar o grau de investigação que ali vai... Ainda lhe disse: “Mas isso dá para escrever mais do que uma lista de compras para uma família monoparental?” Ao que ela me lançou um olhar fulminante de quem está perante um fenómeno do entroncamento da tecnonabice e da tecnoignorância, atirando um gélido “Até a Presidência da República já aderiu!...”
Calei-me e lá lhe dei uma nota inflacionada não fosse a intimidade dela com o Professor Cavaco vir a trazer-me chatices. Devem ter em comum a leitura da Utopia.
À luz do twiter, é bom de ver. Aliás, na Utopia o twiter já está previsto. E, claro que só posso vergar-me a quem, como eu, gosta de Thomas Mann...
Bom, mas estou a afastar-me do que me aconteceu esta semana. Não vos vou maçar com os quiproquós da minha conversa desencontrada com vários amigos nesse serão. Só vos digo que metia temas tão esotéricos como cartuchos (aqueles que se punham a tocar com três ou quatro músicas nos bons carros, bons à dimensão portuguesa, como toyotas celicas e assim, nos anos 70), cartuchos, dizia, tabopan, o terrível álbum “crime of the century” dos supertramp e buracos negros. As pessoas, no final, diziam-me que não percebiam bem onde eu queria chegar. Ainda ontem um amigo mo repetiu de viva voz. Ora eu não ando a tomar drogas que não sejam receitadas pelo médico, não tinha bebido e estava a falar com pessoas mais inteligentes do que a média (basta serem meus amigos) e com as quais não costumo ter dificuldades de comunicação.
Só podia ser do facebook.
Ou do meu síndrome de tecnonabice.
E era dos dois, conclui.
Mas agora não vos posso contar, pois tenho um jantar de anos. Mais um! Somos tantos os nascidos em Maio: isto é que é produzir em Agosto!
Mas, como diria o governador da Califórnia, “I’ll be back!”
Assumo, como agora se diz. E como assumo, estou perdoada, como agora se faz.
Assumo, logo esqueço.
Mas eu não esqueço. Nem que quisesse não poderia esquecer, porque a tecnonabice me complica imenso a vida. Todos os dias.
O conceito de tecnonabo está explicado num dos últimos livros de Miguel Esteves Cardoso, creio que no “A Minha Andorinha”. Quando li o artigo, todo muito bem explicadinho como é habitual no MEC, a pensar nos moços e moças dos 7 aos 77, adoptei logo o epíteto, o cognome, a aptidão. Passou a ser uma das minhas competências, como agora se diz e se exige. Neste caso a competência da minha incompetência. Enfim, fiquei mais contente por já ter um nome para a síndrome de que padeço (sim, síndrome ou sindroma são femininos – posso ser tecnonaba, mas tento não dar erros de português, o que não é fácil, diga-se).
E vem isto ao dance floor por causa do que me aconteceu esta semana.
Num destes serões da província estive eu a responder a várias pessoas no facebook. Para já, desconfio que isto não é assim. Não se responde no facebook como quem “deve” uma carta ou até um mail. Está-se ali e logo se vê quem está on line e pia primeiro.
Bom, mas eu estive talvez umas três ou quatro horas na conversa, ou melhor, no teclanço e, no final, só tinha comentários a dizer que não se percebia nada do que eu estava dizer, ou que só viam duas ou três frases, quando eu tinha escrito umas esforçadas duas ou três páginas de texto! Fiquei siderada com a injustiça! Como se não bastasse, já durante o “processo” da conversa, quando eu me entusiasmava mais, acabava o espaço disponível para escrever! Vamos nós lançados e eis que de repente ficamos desguarnecidos de material, como se tivéssemos que sobreviver com uma ração de combate na Jamba ou regatear senhas de racionamento na Segunda Guerra Mundial! Assim não, catano!...
Eu devia ter desconfiado quando comecei a ver alunos meus muitos entusiasmados com o facebook e, sobretudo com o twiter – houve uma despachada, uma “lista” como dizem os espanhóis, que até me disse que basicamente vivia no e para o twiter e que os trabalhos de “investigação” dela são todos feitos sobre e no twiter. Podem imaginar o grau de investigação que ali vai... Ainda lhe disse: “Mas isso dá para escrever mais do que uma lista de compras para uma família monoparental?” Ao que ela me lançou um olhar fulminante de quem está perante um fenómeno do entroncamento da tecnonabice e da tecnoignorância, atirando um gélido “Até a Presidência da República já aderiu!...”
Calei-me e lá lhe dei uma nota inflacionada não fosse a intimidade dela com o Professor Cavaco vir a trazer-me chatices. Devem ter em comum a leitura da Utopia.
À luz do twiter, é bom de ver. Aliás, na Utopia o twiter já está previsto. E, claro que só posso vergar-me a quem, como eu, gosta de Thomas Mann...
Bom, mas estou a afastar-me do que me aconteceu esta semana. Não vos vou maçar com os quiproquós da minha conversa desencontrada com vários amigos nesse serão. Só vos digo que metia temas tão esotéricos como cartuchos (aqueles que se punham a tocar com três ou quatro músicas nos bons carros, bons à dimensão portuguesa, como toyotas celicas e assim, nos anos 70), cartuchos, dizia, tabopan, o terrível álbum “crime of the century” dos supertramp e buracos negros. As pessoas, no final, diziam-me que não percebiam bem onde eu queria chegar. Ainda ontem um amigo mo repetiu de viva voz. Ora eu não ando a tomar drogas que não sejam receitadas pelo médico, não tinha bebido e estava a falar com pessoas mais inteligentes do que a média (basta serem meus amigos) e com as quais não costumo ter dificuldades de comunicação.
Só podia ser do facebook.
Ou do meu síndrome de tecnonabice.
E era dos dois, conclui.
Mas agora não vos posso contar, pois tenho um jantar de anos. Mais um! Somos tantos os nascidos em Maio: isto é que é produzir em Agosto!
Mas, como diria o governador da Califórnia, “I’ll be back!”
Liquidação da existência
“Mário Benedetti faleceu há poucos dias em Montevideu e é um herói no Uruguay. [...] Ele gostava de usar palavras simples, visando sobretudo, dizia ele, a classe média.” – de um mail enviado, de Alicante, pelo meu amigo Manuel Santos acompanhando esta sua tradução do poema de Benedetti.
Pertencendo à Geração de 45, como os seus compatriotas Idea Vilariño e Juan Carlos Onetti entre outros, Benedetti tem uma vasta produção literária de mais de 80 títulos, entre poesia, ensaio, drama, novela e contos. A maioria de suas obras tem como protagonista a classe média de Montevidéu de onde não gostava de sair.
No entanto, teve uma vida agitada, marcada por longos anos de exílio na Argentina, Cuba e Espanha, durante a ditadura uruguaia.
Doou a sua biblioteca madrilena à Universidade de Alicante onde, desde 1999, funciona o Centro de Estudos IberoAmericanos Mario Benedetti.
Gracias Mario, estés donde estés.
No entanto, teve uma vida agitada, marcada por longos anos de exílio na Argentina, Cuba e Espanha, durante a ditadura uruguaia.
Doou a sua biblioteca madrilena à Universidade de Alicante onde, desde 1999, funciona o Centro de Estudos IberoAmericanos Mario Benedetti.
Gracias Mario, estés donde estés.
PROVA DE VIDA
Ah, quem me salvará de existir?
Fernando Pessoa
Disse o tipo com presunção /
consegui hoje no consulado
a habitual
‘prova de vida’
consta aqui que estou vivo
de maneira que basta de calúnias
este papel magnífico / irrefutável
certifica que eu existo
se dou de caras com o espelho
e o meu rosto não aparece
aguentarei sereno
descansado
não é certo que tenho na carteira
o meu recém adquirido
flamante
certificado de existência?
viver / no fim de contas
não é assim tão fundamental
o importante é que alguém
devidamente autorizado
certifique que a pessoa
comprovadamente existe
quando abro o meu diário e leio
a minha própria necrologia
entristece-me que não saibam
que estou em condições
de mostrar seja onde for
e a qualquer pessoa
um extenso e minucioso
certificado da minha existência
devidamente em vigor
existo
logo penso
quantos fulanos sicranos e beltranos
não andam por aí
pensando que estão vivos
quando na verdade carecem desta genuína
insubstituível
soberana
‘prova de vida’?
Ah, quem me salvará de existir?
Fernando Pessoa
Disse o tipo com presunção /
consegui hoje no consulado
a habitual
‘prova de vida’
consta aqui que estou vivo
de maneira que basta de calúnias
este papel magnífico / irrefutável
certifica que eu existo
se dou de caras com o espelho
e o meu rosto não aparece
aguentarei sereno
descansado
não é certo que tenho na carteira
o meu recém adquirido
flamante
certificado de existência?
viver / no fim de contas
não é assim tão fundamental
o importante é que alguém
devidamente autorizado
certifique que a pessoa
comprovadamente existe
quando abro o meu diário e leio
a minha própria necrologia
entristece-me que não saibam
que estou em condições
de mostrar seja onde for
e a qualquer pessoa
um extenso e minucioso
certificado da minha existência
devidamente em vigor
existo
logo penso
quantos fulanos sicranos e beltranos
não andam por aí
pensando que estão vivos
quando na verdade carecem desta genuína
insubstituível
soberana
‘prova de vida’?
Tradução de Manuel Santos.
Obrigada, Manuel.
Obrigada, Manuel.
21 de maio de 2009
Strindberg
Erik Johansson
Strindberg
Agora que morremos, a vida pode enfim recomeçar.
Agora que a vida parou, podemos falar uns dos outros sem o espectro da ofensa.
Agora basta olhar como nos era dado muito pouco, muito menos do que suspeitámos.
Espreitando entre portas, pressentimos as peças que faltavam,
subentendidos,
falangetas perdidas como elos naturalistas espalhados pela floresta.
Rumores de anões atarefados e cogumelos a crescer nos bastidores,
brumas no sótão e corridas de ratos na casa da lenha
rigorosamente
empilhada para o inverno.
Para viver tínhamos que esquecer prazos e limites.
Desleixados, não sorvíamos a vida a plenos pulmões.
Distraímo-nos e adiámos a eternidade em troca do urgente.
Parece que Nietzsche viu isto e enlouqueceu.
17 de maio de 2009
Bússola sexual (numa noite que devia ser de primavera, mas afinal chove)
Ouvi agora ao jantar algo que se passou já há alguns dias. Parece que o psiquiatra Adriano Vaz Serra, Presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e João Marques Teixeira, Presidente do Colégio da Especialidade de Psiquiatria da Ordem dos Médicos, em entrevista ao jornal "Público", afirmam ser possível reeducar a orientação sexual e a identidade de género. Como a entevista data de 2 de Maio e já não tenho acesso ao jornal, não a posso ler.
Fico pois na dúvida: ajudam a orientar, sim. Mas em que sentido?
É que um homem que não aprecia muito as mulheres ou uma mulher que não se interessa por aí além por homens podem, de facto, com uma ajudinha médica passar a orientar-se melhor. Depois das consultas com estes Doutores, o homem que duvidava da sua orientação sexual fica a saber que afinal é mesmo de outros homens que gosta e a rapariga lança-se nos braços de outras como ela.
Assim sim, precisamos de gente que nos oriente. E se há terapias e medicamentos para tirar essas dúvidas e nos fazer produzir mais, acho até que devia haver comparticipação do Serviço Nacional de Saúde nestas consultas.
Ganha o país, ganhamos todos.
Bem basta a crise e o desemprego a aumentar, para ainda termos desorientados sexuais!
(p.s.: faltava o boneco, só pôde ser agora, um dia depois)
Fico pois na dúvida: ajudam a orientar, sim. Mas em que sentido?
É que um homem que não aprecia muito as mulheres ou uma mulher que não se interessa por aí além por homens podem, de facto, com uma ajudinha médica passar a orientar-se melhor. Depois das consultas com estes Doutores, o homem que duvidava da sua orientação sexual fica a saber que afinal é mesmo de outros homens que gosta e a rapariga lança-se nos braços de outras como ela.
Assim sim, precisamos de gente que nos oriente. E se há terapias e medicamentos para tirar essas dúvidas e nos fazer produzir mais, acho até que devia haver comparticipação do Serviço Nacional de Saúde nestas consultas.
Ganha o país, ganhamos todos.
Bem basta a crise e o desemprego a aumentar, para ainda termos desorientados sexuais!
(p.s.: faltava o boneco, só pôde ser agora, um dia depois)
12 de maio de 2009
animais políticos
Tão auto-estatístico
Visitei há dias, um pouco ao sabor das teclas, um site, pareceu-me que de um partido político.
Tão acolhedor, tão tranquilizador, tão reflector, tão retrovisor, tão espelho, tão nós, tão gémeo, tão liso, tão fácil, tão flutuante, tão sobre-rodas, tão alcatifado, tão fofo, tão música de elevador, tão piano da calça, tão chopinado, tão aromático, tão anarinado, tão almofarizado, tão bem misturado, tão virtual, tão virtuoso, tão agdeusnóstico, tão vampiro bom, tão evangelho segundo são almodovar, tão downlador, tão importador, tão popista, tão sem iva, tão agora afro-americano, tão empossado, tão solenemente ajuramentado, tão ecológico, tão eucológico, tão tucológico, tão elecológico, tão vento, tão brisa, tão maré, tão oceânico, tão algarvado, tão escovado, tão penteado, tão alisado, tão engomado, tão gel, tão quadro de honra, tão betinho, tão eusebiozinho, tão premiado, tão tutelado, tão liofilizado, tão alibizado, tão calcificado, tão aporcelanado, tão branqueado, tão dietético, tão aspartâmico, tão antivírico, tão à base de leite de burra, tão cristaleiro, tão euroteu, tão coral, tão adolescental, tão afinado, tão povoado, tão romano-gótico, tão cantochão, tão renda de bruxelas, tão mangas de camisa, tão ténis, tão jeans, tão mtv, tão efeitos especiais, tão produções marvel, tão pró-activo, tão auto-estatístico, tão etária, sexual, gestual, comportamental, moral, deontológico, cultural, politicamente correcto, tão azulado, tão cerúleo, tão cerúleo, tão cerúleo, tão ideologicamente albino, tão ensaio sobre a miopia, tão preugmático, tão volocalista, tão slogandado, tão rimado com si mesmo, tão bem colado, tão desenrugado, tão plastificado, tão loja da cidadania, tão poster de si mesmo, tão auto-hipnotizado, tão masteurbativo, tão massajado, tão turcamente banhado, tão tudo, tão todos, tão nada, tão ninguém, tão coisa nenhuma, tão panteuístico, tão in, tão out, tão self, tão soft, tão swift, que percebi que não era um site.
Eram vários.
Há outros?
Artur Portela
(enviado por Artur Portela)
Tão acolhedor, tão tranquilizador, tão reflector, tão retrovisor, tão espelho, tão nós, tão gémeo, tão liso, tão fácil, tão flutuante, tão sobre-rodas, tão alcatifado, tão fofo, tão música de elevador, tão piano da calça, tão chopinado, tão aromático, tão anarinado, tão almofarizado, tão bem misturado, tão virtual, tão virtuoso, tão agdeusnóstico, tão vampiro bom, tão evangelho segundo são almodovar, tão downlador, tão importador, tão popista, tão sem iva, tão agora afro-americano, tão empossado, tão solenemente ajuramentado, tão ecológico, tão eucológico, tão tucológico, tão elecológico, tão vento, tão brisa, tão maré, tão oceânico, tão algarvado, tão escovado, tão penteado, tão alisado, tão engomado, tão gel, tão quadro de honra, tão betinho, tão eusebiozinho, tão premiado, tão tutelado, tão liofilizado, tão alibizado, tão calcificado, tão aporcelanado, tão branqueado, tão dietético, tão aspartâmico, tão antivírico, tão à base de leite de burra, tão cristaleiro, tão euroteu, tão coral, tão adolescental, tão afinado, tão povoado, tão romano-gótico, tão cantochão, tão renda de bruxelas, tão mangas de camisa, tão ténis, tão jeans, tão mtv, tão efeitos especiais, tão produções marvel, tão pró-activo, tão auto-estatístico, tão etária, sexual, gestual, comportamental, moral, deontológico, cultural, politicamente correcto, tão azulado, tão cerúleo, tão cerúleo, tão cerúleo, tão ideologicamente albino, tão ensaio sobre a miopia, tão preugmático, tão volocalista, tão slogandado, tão rimado com si mesmo, tão bem colado, tão desenrugado, tão plastificado, tão loja da cidadania, tão poster de si mesmo, tão auto-hipnotizado, tão masteurbativo, tão massajado, tão turcamente banhado, tão tudo, tão todos, tão nada, tão ninguém, tão coisa nenhuma, tão panteuístico, tão in, tão out, tão self, tão soft, tão swift, que percebi que não era um site.
Eram vários.
Há outros?
Artur Portela
(enviado por Artur Portela)
11 de maio de 2009
Aviso por causa da mural
Anuncia-se nova tradução de A Montanha Mágica de Thomas Mann. Falsamente apresentada (via editora, jornais e outros seres sumamente esclarecidos) como a primeira tradução feita directamente do alemão para o português, lemos felizmente as palavras da tradutora Gilda Lopes Encarnação esclarecendo o que a vox publicitari teima em negar: esta NÃO é a primeira tradução do alemão para português. Um exemplo da perguntinha repetida e previamente armadilhada:
“Esta é a primeira tradução para português feita directamente do alemão?
Não, trata-se apenas da primeira tradução para português europeu, porque já havia uma no Brasil, também feita directamente do alemão por Herbert Caro. Foi uma tradução que depois teve uma adaptação estilística, ao ser publicada em Portugal, que na minha opinião não foi bem sucedida, como acontece muitas vezes nestes casos.”
(JL on line a Gilda Lopes Encarnação)
Mas então o que é isto? Por que se insiste nesta que já li repetidamente? Inventamos a divisão de uma língua por causa de negócios editoriais e distribuímos estigmas de traduções de primeira e segunda qualidade, consoante o lado do atlântico de onde o vento sopra? Que a desnecessária adaptação (de português para português para o caso de nós, portugueses, podermos não compreender português) tenha dado mau resultado é compreensível, até pelo princípio absurdo da coisa e pela alegada canhestridade de quem a fez. Vem essa tradução do tempos em que das edições nem constavam datas, tão intemporais se consideravam. Nasciam e eram logo um clássico. Tiro e queda.
Mas daí a dizer que não havia até agora tradução portuguesa, é um eufemismo ousado que, na linguagem comum, tem o singelo nome de aldrabice.
E logo o eufemismo vem de mansinho, de mão dada com a perífrase do “português europeu” para salvar a casa, a honra e as vendas da editora (que não precisa: a edição antiga, a dos “Livros do Brasil” não se encontra há muito, creio).
Enfim, está o anúncio da magia da montanha entalado nestas figuras de estilo e está a verdade sem estilo nenhum...
Para usar uma expressão da moda, é uma não-tradução, numa não-livraria, mas talvez num sim-alfarrabista, na maioria quase-não-alfarrabistas ou muito, muito assim-assim.
Mas agora pergunto eu: durante quanto tempo vamos ainda dizer: “existe tradução, mas é brasileira”.
E depois? De quem é a língua?
Ou estamos como o Saramago que, no Brasil, questionado por um ouvinte que objectava não lhe “perceber o sotaque” respondeu olimpicamente, lá do alto do seu Nobel made in Lanzarote, “O sotaque é seu. A língua é minha!”
“Toma, qu’é práprederes!” – como diz a catraiada quando o mânfio da escola esfola o joelhos.
Assim é que é, José! És cá dos meus! Nós é que sabemos falar, escrever e traduzir. Nas colónias, já se sabe, é leite de côco na praia e pontapé na gramática.
Todos nós, os mais crescidos, lemos (os que lemos) muita obra determinante pela primeira vez em tradução brasileira: desde o Tio Patinhas ao Ulisses de Joyce - embora desconfie que haja mais gente a dizer que leu o Ulisses do que assumir que leu o Patinhas, quando na verdade foi ao contrário.
E então? Desaprendemos com isso? Com essa língua que é nossa e que lhes emprestámos para eles traduzirem aquilo que não éramos capazes de ler no original ou de traduzir?
Houve, durante muito tempo, o mito de que as traduções brasileiras, por serem abundantes, eram descuidadas. É possível. E as nossas? Com meia dúzia (se tanto) de revisores decentes em Portugal, temos actualmente um lindo panorama de frases nonsense, calinadas de palmatória, edições inapresentáveis, etc.
E a língua é nossa.
Se calhar é por isso: como é nossa, podemos dar cabo dela.
E passo ao largo do fantasma do tímido acordo ortográfico de que muitos falam e poucos leram. Não vamos por aí - como agora se diz quando o GPS da conversa entra em veredas pouco iluminadas.
Bom, mas tudo isto é o folclore habitual nestas andanças.
O que eu sei é que está uma obra prima posta em sossego, a ganhar pó nas estantes com poucos a lembrarem-se dela e de repente “é minha, é minha!” Lá diz o ditado: a montanha mágica da minha vizinha é melhor do que a minha.
Adiante, que é feira de Mangualde.
O que eu queria dizer é que, por simples coincidência e antes de saber que se anunciava o regresso da obra de Mann aos hipermercados portugueses, comecei a ler (depois de também eu o ter tido a apanhar pó durante mais de 20 anos e depois de uma ou duas tentativas de leitura pouco empenhadas) comecei a ler, dizia, “A Montanha Mágica”. Li em dois dias as primeiras 100 páginas e não sei quando voltarei a ter o luxo de tempo para a retomar.
E, meus amigos, antes que comece tudo a dizer “aquilo é que é”, ponho-me já na primeira fila e, mesmo com a tradução “estrangeira” de Herbert Caro, asseguro que é um murro no estômago. Uma grande murraça de ficar amassado e pedir mais.
Tentarei voltar à carga, assim que puder. E dizer qualquer coisa, se conseguir.
Para já, deixo a posologia recomendada pelo próprio Thomas Mann.
“O que devo eu então dizer sobre o próprio livro (Montanha Mágica) e ainda por cima, como deve ser lido? O começo é uma exigência muito arrogante, a dizer que se deva lê-lo duas vezes. É claro que essa exigência é retirada imediatamente para o caso de que na primeira vez se tenha ficado entediado. A arte não deve ser nenhum trabalho escolar nem dificuldade, nenhuma ocupação contre coeur, mas sim deve alegrar, entreter e animar e aquele sobre o qual uma obra não exerce esse efeito então este deve deixar a obra de lado e voltar-se para outra. Mas quem chegou uma vez até o final com a “Montanha Mágica” então eu aconselho a lê-la mais uma vez, pois seu feitio particular, seu caráter como composição traz consigo que o prazer do leitor aumentará e se aprofundará da segunda vez, - como se deve já conhecer uma música para poder gozá-la de acordo. Não casualmente utilizei a palavra composição, a qual se costuma reservar à música. A música sempre influenciou meu trabalho formando fortemente meu estilo. Os poetas são, na maioria das vezes, outra coisa no fundo, eles são pintores ou gráficos ou escultores ou arquitetos deslocados ou outra coisa qualquer. Quanto a mim, eu pertenço aos músicos entre os poetas. O romance sempre foi para mim uma sinfonia, um trabalho de contraponto, um tecido de temas no qual as idéias têm o papel de motivos musicais.”
Extracto de Conferência apresentada por Thomas Mann em Maio de 1939 aos estudantes da Universidade de Princeton.
(Nota: não sei se deu para perceber, porque a tradução está em estrangeiro. Devia ter procurado em alemão para todos entendermos.)
Com isto, não há que enganar: podemos ler as duas traduções que não nos fará mal. Vem na literatura inclusa.
“Esta é a primeira tradução para português feita directamente do alemão?
Não, trata-se apenas da primeira tradução para português europeu, porque já havia uma no Brasil, também feita directamente do alemão por Herbert Caro. Foi uma tradução que depois teve uma adaptação estilística, ao ser publicada em Portugal, que na minha opinião não foi bem sucedida, como acontece muitas vezes nestes casos.”
(JL on line a Gilda Lopes Encarnação)
Mas então o que é isto? Por que se insiste nesta que já li repetidamente? Inventamos a divisão de uma língua por causa de negócios editoriais e distribuímos estigmas de traduções de primeira e segunda qualidade, consoante o lado do atlântico de onde o vento sopra? Que a desnecessária adaptação (de português para português para o caso de nós, portugueses, podermos não compreender português) tenha dado mau resultado é compreensível, até pelo princípio absurdo da coisa e pela alegada canhestridade de quem a fez. Vem essa tradução do tempos em que das edições nem constavam datas, tão intemporais se consideravam. Nasciam e eram logo um clássico. Tiro e queda.
Mas daí a dizer que não havia até agora tradução portuguesa, é um eufemismo ousado que, na linguagem comum, tem o singelo nome de aldrabice.
E logo o eufemismo vem de mansinho, de mão dada com a perífrase do “português europeu” para salvar a casa, a honra e as vendas da editora (que não precisa: a edição antiga, a dos “Livros do Brasil” não se encontra há muito, creio).
Enfim, está o anúncio da magia da montanha entalado nestas figuras de estilo e está a verdade sem estilo nenhum...
Para usar uma expressão da moda, é uma não-tradução, numa não-livraria, mas talvez num sim-alfarrabista, na maioria quase-não-alfarrabistas ou muito, muito assim-assim.
Mas agora pergunto eu: durante quanto tempo vamos ainda dizer: “existe tradução, mas é brasileira”.
E depois? De quem é a língua?
Ou estamos como o Saramago que, no Brasil, questionado por um ouvinte que objectava não lhe “perceber o sotaque” respondeu olimpicamente, lá do alto do seu Nobel made in Lanzarote, “O sotaque é seu. A língua é minha!”
“Toma, qu’é práprederes!” – como diz a catraiada quando o mânfio da escola esfola o joelhos.
Assim é que é, José! És cá dos meus! Nós é que sabemos falar, escrever e traduzir. Nas colónias, já se sabe, é leite de côco na praia e pontapé na gramática.
Todos nós, os mais crescidos, lemos (os que lemos) muita obra determinante pela primeira vez em tradução brasileira: desde o Tio Patinhas ao Ulisses de Joyce - embora desconfie que haja mais gente a dizer que leu o Ulisses do que assumir que leu o Patinhas, quando na verdade foi ao contrário.
E então? Desaprendemos com isso? Com essa língua que é nossa e que lhes emprestámos para eles traduzirem aquilo que não éramos capazes de ler no original ou de traduzir?
Houve, durante muito tempo, o mito de que as traduções brasileiras, por serem abundantes, eram descuidadas. É possível. E as nossas? Com meia dúzia (se tanto) de revisores decentes em Portugal, temos actualmente um lindo panorama de frases nonsense, calinadas de palmatória, edições inapresentáveis, etc.
E a língua é nossa.
Se calhar é por isso: como é nossa, podemos dar cabo dela.
E passo ao largo do fantasma do tímido acordo ortográfico de que muitos falam e poucos leram. Não vamos por aí - como agora se diz quando o GPS da conversa entra em veredas pouco iluminadas.
Bom, mas tudo isto é o folclore habitual nestas andanças.
O que eu sei é que está uma obra prima posta em sossego, a ganhar pó nas estantes com poucos a lembrarem-se dela e de repente “é minha, é minha!” Lá diz o ditado: a montanha mágica da minha vizinha é melhor do que a minha.
Adiante, que é feira de Mangualde.
O que eu queria dizer é que, por simples coincidência e antes de saber que se anunciava o regresso da obra de Mann aos hipermercados portugueses, comecei a ler (depois de também eu o ter tido a apanhar pó durante mais de 20 anos e depois de uma ou duas tentativas de leitura pouco empenhadas) comecei a ler, dizia, “A Montanha Mágica”. Li em dois dias as primeiras 100 páginas e não sei quando voltarei a ter o luxo de tempo para a retomar.
E, meus amigos, antes que comece tudo a dizer “aquilo é que é”, ponho-me já na primeira fila e, mesmo com a tradução “estrangeira” de Herbert Caro, asseguro que é um murro no estômago. Uma grande murraça de ficar amassado e pedir mais.
Tentarei voltar à carga, assim que puder. E dizer qualquer coisa, se conseguir.
Para já, deixo a posologia recomendada pelo próprio Thomas Mann.
“O que devo eu então dizer sobre o próprio livro (Montanha Mágica) e ainda por cima, como deve ser lido? O começo é uma exigência muito arrogante, a dizer que se deva lê-lo duas vezes. É claro que essa exigência é retirada imediatamente para o caso de que na primeira vez se tenha ficado entediado. A arte não deve ser nenhum trabalho escolar nem dificuldade, nenhuma ocupação contre coeur, mas sim deve alegrar, entreter e animar e aquele sobre o qual uma obra não exerce esse efeito então este deve deixar a obra de lado e voltar-se para outra. Mas quem chegou uma vez até o final com a “Montanha Mágica” então eu aconselho a lê-la mais uma vez, pois seu feitio particular, seu caráter como composição traz consigo que o prazer do leitor aumentará e se aprofundará da segunda vez, - como se deve já conhecer uma música para poder gozá-la de acordo. Não casualmente utilizei a palavra composição, a qual se costuma reservar à música. A música sempre influenciou meu trabalho formando fortemente meu estilo. Os poetas são, na maioria das vezes, outra coisa no fundo, eles são pintores ou gráficos ou escultores ou arquitetos deslocados ou outra coisa qualquer. Quanto a mim, eu pertenço aos músicos entre os poetas. O romance sempre foi para mim uma sinfonia, um trabalho de contraponto, um tecido de temas no qual as idéias têm o papel de motivos musicais.”
Extracto de Conferência apresentada por Thomas Mann em Maio de 1939 aos estudantes da Universidade de Princeton.
(Nota: não sei se deu para perceber, porque a tradução está em estrangeiro. Devia ter procurado em alemão para todos entendermos.)
Com isto, não há que enganar: podemos ler as duas traduções que não nos fará mal. Vem na literatura inclusa.
8 de maio de 2009
De Tbilissi com whispered pop
Aqui deixo a memória de um concerto surpreendente no cinema Passos Manuel, Porto, abril de 2005.
Post industrial boys
Rapazes sozinhos na georgia a fazer música debruçados nos computadores
longas noites de inverno e eles a emitirem para o mundo como para marte
Post industrial voice
Ele tinha aquele problema enquanto dançava: via os outros corpos na pista dançando como esqueletos. Por mais que olhasse confirmava sempre aquela visão: eram esqueletos esbranquiçados a balançarem com ritmo.
Desaparecidos a roupa, a carne, os órgãos, tudo o que envolvia os ossos pálidos,
esboço incandescente sob a luz negra.
Punha discos tão remisturados, com sobreposições tão difíceis de identificar que eram discos irredutíveis, músicas que não existiam em lado nenhum.
Era um fantasma do pós-comunismo como o seu país. Longe das avenidas haussmanizadas do centro, fazia música no computador, vergado ao peso da concentração dos dedos sobre os teclados, adolescente que cresce durante a noite e corcunda não afeito ao recente comprimento do corpo.
Entre a mesquita e a sinagoga, saía-lhe aquela música irónica embrulhada em bossa nova: nebulosa e leve, cinza soprada de um pipe line transiberiano.
O governo georgiano libertou os três activistas da oposição cuja detenção havia desencadeado violentos protestos em Tbilissi. Pelo menos 28 pessoas tinham ficado gravemente feridas nos confrontos entre polícia e manifestantes que exigem a demissão do Presidente, Mikhail Saakachvili, acusado de autoritarismo, de ser reeleito com fraude e responsabilizado pela derrota na guerra contra a Rússia.
Enfim, volta a falar-se da Geórgia.
Enfim, volta a falar-se da Geórgia.
Aqui deixo a memória de um concerto surpreendente no cinema Passos Manuel, Porto, abril de 2005.
Post industrial boys
Rapazes sozinhos na georgia a fazer música debruçados nos computadores
longas noites de inverno e eles a emitirem para o mundo como para marte
Post industrial voice
Ele tinha aquele problema enquanto dançava: via os outros corpos na pista dançando como esqueletos. Por mais que olhasse confirmava sempre aquela visão: eram esqueletos esbranquiçados a balançarem com ritmo.
Desaparecidos a roupa, a carne, os órgãos, tudo o que envolvia os ossos pálidos,
esboço incandescente sob a luz negra.
Punha discos tão remisturados, com sobreposições tão difíceis de identificar que eram discos irredutíveis, músicas que não existiam em lado nenhum.
Era um fantasma do pós-comunismo como o seu país. Longe das avenidas haussmanizadas do centro, fazia música no computador, vergado ao peso da concentração dos dedos sobre os teclados, adolescente que cresce durante a noite e corcunda não afeito ao recente comprimento do corpo.
Entre a mesquita e a sinagoga, saía-lhe aquela música irónica embrulhada em bossa nova: nebulosa e leve, cinza soprada de um pipe line transiberiano.
5 de maio de 2009
gripes e c.ª
Nós por cá todos mal.
Nubelizações, enumerações, nefelibatizações, klennex, ben-ur-ões, mocas de oxigénio e irritações da juventude enclausurada.
Ainda não piamos nem grunhimos, portanto não é gripe das aves nem dos bácoros.
Mas não falta muito para andarmos à estalada.
Nos filmes franceses há sempre estalada no meio da desconjugalidade (quase sempre entre 1/2 e 2/3 da duração do filme).
Será esta uma gripe francesa?
Ai, ai...
Nubelizações, enumerações, nefelibatizações, klennex, ben-ur-ões, mocas de oxigénio e irritações da juventude enclausurada.
Ainda não piamos nem grunhimos, portanto não é gripe das aves nem dos bácoros.
Mas não falta muito para andarmos à estalada.
Nos filmes franceses há sempre estalada no meio da desconjugalidade (quase sempre entre 1/2 e 2/3 da duração do filme).
Será esta uma gripe francesa?
Ai, ai...
2 de maio de 2009
OBRA COERSIVA EM SUBSTITUIÇÃO DO PROPRIETÁRIO
Foi o que por aqui aconteceu durante 10 meses. E já se sabe como é com as obras. Seja em casa, no nosso corpinho ou no automóvel, acabamos sempre a ouvir a frase fatal: “é preciso desmontar o motor para ver a dimensão do estrago...”
Agora, quando a casa está a cair, aparecem, numa manhã com nevoeiro ou com boas abertas, gruas, caterpillars (que eu digo orgulhosamente catrapilas, como o povão que as maneja) e toca a desmanchar o que ainda está de pé e a erguer novo edifício em três tempos. Aí é que se vê como a construção civil pode acelerar: precisa é de uma direcção forte.
À frente do edifício colocam um letreiro orgulhoso e gossip para o qual a vizinhança mal se atreve a olhar, com perigo de acidentes para quem conduz e tem que ler repetidamente para crer. E diz a letras altas e bem torneadas:
“OBRA COERSIVA EM SUBSTITUIÇÃO DO PROPRIETÁRIO”
Foi o que vi acontecer aqui perto de minha casa e foi, de certo modo, o que aconteceu aqui no blog.
A ver se entramos finalmente nos acabamentos.
Bom ex-natal, ex-páscoa e agora boa primavera para quem vier a ler.
Agora, quando a casa está a cair, aparecem, numa manhã com nevoeiro ou com boas abertas, gruas, caterpillars (que eu digo orgulhosamente catrapilas, como o povão que as maneja) e toca a desmanchar o que ainda está de pé e a erguer novo edifício em três tempos. Aí é que se vê como a construção civil pode acelerar: precisa é de uma direcção forte.
À frente do edifício colocam um letreiro orgulhoso e gossip para o qual a vizinhança mal se atreve a olhar, com perigo de acidentes para quem conduz e tem que ler repetidamente para crer. E diz a letras altas e bem torneadas:
“OBRA COERSIVA EM SUBSTITUIÇÃO DO PROPRIETÁRIO”
Foi o que vi acontecer aqui perto de minha casa e foi, de certo modo, o que aconteceu aqui no blog.
A ver se entramos finalmente nos acabamentos.
Bom ex-natal, ex-páscoa e agora boa primavera para quem vier a ler.
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